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MOÇÃO PELO COMBATE À VIOLÊNCIA DE GÉNERO

Apresentada pelo Bloco de Esquerda Sesimbra na Assembleia Municipal de dia 22 de Fevereiro e aprovada por unanimidade

Considerando que:
(i) O combate à violência de género é um dos maiores desafios das nossas sociedades;
(ii) A violência de género toma várias formas, sendo Portugal assolado por um número de crimes de violência doméstica e violação muito elevado e maioritariamente direcionado contra mulheres, que devem fazer ponderar as medidas implementadas até hoje e novas formas de combater este flagelo;
(iii) Segundo o Observatório de Mulheres Assassinadas da UMAR, nos últimos 15 anos morreram 503 mulheres e cerca de 600 foram vítimas de tentativas de assassinato. No mesmo período, mais de 1000 crianças ficaram órfãs. 
(iv) Em 2018, registaram-se, em Portugal, 29.734 participações do crime de Violência Doméstica;
(v) Por outro lado, a violência doméstica é o crime contra as pessoas que mais mata em Portugal. Este crime continua a assumir-se como uma das principais formas de criminalidade, sendo que, nos crimes contra as pessoas, é apenas superado em número de ocorrências, pelo crime de ofensa à integridade física simples, segundo dados do Relatório Anual de Segurança Interna de 2017 (RASI 2017).
(vi) Apesar de, passados 18 anos, ser pacífico na sociedade portuguesa o mérito de se ter tornado a violência doméstica crime público, apesar das inúmeras campanhas de sensibilização, apesar de todas as denúncias, o crime de violência doméstica continua a ter uma prevalência muito grande;
(vii) Só este ano, 2019, já foram assassinadas 10 mulheres e 1 criança em contexto de violência doméstica e de relações de intimidade. Nestes casos, existiam já processos, queixas, tentativas de pedir ajuda que não foram ouvidas por ninguém. O sistema que deveria apoiar as vítimas de violência doméstica continua a falhar redondamente.
(viii) Por outro lado, o crime de violação atinge, sobretudo, mulheres e crianças. Apesar da neutralidade prevista no tipo legal de violação quanto ao género da vítima, este crime é, indubitavelmente, uma forma de violência de género, e uma das mais invisíveis. 
(ix) Em Portugal, de acordo com os dados do RASI 2017, as participações do crime de violação aumentaram, de 2016 para 2017, 21,8% e foram apresentadas 408 queixas às forças de segurança. Segundo a mesma fonte, a esmagadora maioria de agressores enquadra-se em relações de proximidade familiar ou de conhecimento, sendo por isso falsa a ideia de que o crime de violação é cometido por estranhos.
(x) Neste quadro, afigura-se a necessidade de um debate aprofundado e sério da sociedade portuguesa, que ouça com mais atenção as várias organizações que trabalham diariamente com estes casos de violência, bem como organizações internacionais, profissionais da justiça, entre outros.
(xi) Concordando com a necessidade permanente de existir formação, os números indicam claramente que isso não chega. Tudo o que se fizer neste âmbito, seja de nível nacional ou local, será sempre pouco enquanto o número de femicídios for tão elevado. 
(xii) A gravidade da situação não se coaduna com o rejeitar de possíveis alterações à legislação, ora porque haverá sempre juízes ou juízas que tomam más decisões, ora porque o que é preciso mudar são as mentalidades. Ignorar, por exemplo, que o enquadramento legal atual potencia as penas suspensas para penas abaixo de 5 anos para este tipo de crimes é deixar as vítimas expostas a mais violência.

Assim, a Assembleia Municipal de Sesimbra, reunida em 22 de fevereiro de 2019, delibera, 
Saudar todas as manifestações e concentrações que, nas últimas e próximas semanas, ocorrerão por todo o país exigindo medidas efetivas de combate à violência de género;
1. Exigir ao Governo e à Assembleia da República que tomem o combate à violência de género como prioridade política efetiva;
2. Instar aos respetivos órgãos de soberania a procederem às seguintes medidas: 
a. Alteração das molduras penais para os crimes de violência doméstica, sexual e contra menores;
b. Adequação do Código Penal à Convenção de Istambul, cumprindo as recomendações do GREVIO no último relatório sobre a aplicação da Convenção em Portugal, estabelecendo o consentimento como linha vermelha do crime de violação e consagrando o crime de violação como crime público;
c. Extensão da aplicação de prisão preventiva a crimes de violência doméstica e proibir a aplicação do instituto da suspensão provisória do processo a este tipo de crimes;
d. Garantir a articulação entre o processo crime e o processo de regulação das responsabilidades parentais (quando exista). Não é possível separar estes dois processos, deixando as vítimas mais vulneráveis perante o agressor;
e. Aplicação das medidas de coação “proibição de contacto e imposição de condutas” ao crime de perseguição (stalking), pois é um passo para garantir a proteção da vítima durante a fase de inquérito.
3. Instar o Governo a acelerar os processos de formação e sensibilização dos e das várias agentes nos processos de violência: juízes e magistrados, forças de segurança, assistentes sociais, técnicos de saúde. 
4. Instar o Governo a iniciar o processo de debate alargado para a criação de equipas multidisciplinares especializadas. 
5. Remeter esta moção ao Governo, Presidente da Assembleia da República e Grupos Parlamentares.
Bloco de Esquerda de Sesimbra.